Infância em tempos distópicos: O que pode a Psicanálise?

Vivemos tempos difíceis, e a distopia como sinônimo de desesperança é uma imagem que
evocamos para pensar a vivência das crianças no século XXI. O que pode a psicanálise nesse
cenário? Vários psicanalistas foram convidados a responder a esta questão, tendo como fio
condutor o desamparo, tanto estrutural quanto contingente. Do discurso médico ao discurso
pedagógico, da inexistência do Outro à parentalidade frágil, da incidência das nomeações às
questões diagnósticas, passando pela clínica do abandono, da depressão e do autismo,
situações clínicas e produções culturais são analisadas, para ajudar nessa reflexão.
Vivemos tempos difíceis, de oscilação dos valores civilizatórios que norteiam nosso
cotidiano. Nesse sentido, estamos todos desamparados neste mundo que se anuncia sem
Outro.

Por isso, o fio condutor deste volume é a questão do desamparo. A pergunta provocadora
lançada aos autores no momento do convite à escrita foi: “infância e desamparo, ser criança
no século XXI”. Cada qual a respondeu segundo seu estilo, suas experiências, sua clínica.
Desamparo é um conceito psicanalítico, nós o encontramos muito cedo na obra de Freud, no
seu Projeto para uma Psicologia Científica. Desde então, trata-se de um dos pilares da teoria
psicanalítica: é desse desamparo que se originam, segundo Freud, “os motivos morais”, ou,
conforme Lacan, a primazia do Simbólico na essência do homem.
Sendo inerente a nossa condição humana, nossa interrogação incide sobre a
contemporaneidade: a infância do século XXI, qual face do desamparo conhece?
Os vários autores que aqui escrevem demonstram – seja por vias teóricas, seja por vias
clínicas – o que pode a psicanálise diante da infância nesses tempos distópicos!

Leda Mariza Fischer Bernardino, organizadora deste volume, é psicanalista, analista membro da
Associação Psicanalítica de Curitiba, doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento pela USP,
com pós-doutorado em Tratamento e Prevenção Psicológica pela Université Paris 7. Autora de
Neurose infantil versus neurose da criança, e Psicanalisar crianças: que desejo é esse? (Ágalma),
entre outros títulos. Exerce prática clínica em São Paulo.